domingo, 18 de outubro de 2009

A POESIA em VIVIANE MOSÉ





Procurando poemas que digam o que sinto, me encantem e reencantem o dia-a-dia , por instantes, insípido...Lembrei de uma poeta, capixaba, que vive e cria aqui, no Rio. Não tenho, ainda, nenhum dos seus livros de poesia, mas os recomendo. Já a ouvi dizendo... e, seus poemas entranham primeiro na carne, vão se grudando na alma e depois no pensamento.

Seu nome: Viviane Mosé .

Descobri, aqui, os dois poemas reproduzidos abaixo. Espero que gostem!

Toda Palavra


Procuro uma palavra que me salve
Pode ser uma palavra verbo
Uma palavra vespa, uma palavra casta.
Pode ser uma palavra dura. Sem carinho.
Ou palavra muda,
molhada de suor no esforço da terra não lavrada.
Não ligo se ela vem suja, mal lavada.
Procuro uma coisa qualquer que saia soada do nada.
Eu imploro pelos verbos que tanto humilhei
e reconsidero minha posição em relação aos adjetivos.
Penso em quanta fadiga me dava
o excesso de frases desalinhadas em meu ouvido.
Hoje imploro uma fala escrita,
não pode ser cantada.
Preciso de uma palavra letra
grifada grafia no papel.
Uma palavra como um porto
um mar um prado
um campo minado um contorno
carrossel cavalo pente quebrado véu
mariscos muralhas manivelas navalhas.
Eu preciso do escarcéu soletrado
Preciso daquilo que havia negado
E mesmo tendo medo de algumas palavras
preciso da palavra medo como preciso da palavra morte
que é uma palavra triste.
Toda palavra deve ser anunciada e ouvida.
Nunca mais o desprezo por coisas mal ditas.
Toda palavra é bem dita e bem vinda.




Desato


É preciso fritar o arroz bastante antes de jogar água fervendo.
E não pode mexer jamais depois de a água ser posta.
O alho deve fritar no óleo junto com o arroz.

Coisas que eu sei e que não. Eu sei muitas coisas.
Faxina por exemplo. Sei limpar uma casa de tal modo
Que não sobra um canto que não tenha sido tocado
Por minhas mãos.
Depois vou sujando. Com muito gosto.
Deixo peças na sala e louças sujas na pia.
Não na mesma hora mas um pouco
Bastante depois volto limpando.
Assim me faço.
Nos objetos que me acompanham.

Gosto de andar nas ruas e comprar coisas
Que vão se arrumando em torno de mim.
Tenho muitas coisas, quero dizer, tenho muitas camadas.
Uma camada de livros outra de sapatos.
Tem a camada de plantas. E toalhas de rosto.
Tenho camadas de cosméticos e de adereços.
Uma camada de nomes e de coisas que vejo.
Tudo ordenado ao meu redor. Em forma de corpo.
Um corpo que me sustenta quando o meu próprio me falta.

Cadeiras são meus ossos. Sapatos são meus braços.
Torneiras em meus poros. Paredes como roupas de inverno.
(Quando toca música em minha casa sai do umbigo)

Descanso recostada nas paredes da casa
Que me guardam como um abraço.
Me abraço quando me derramo na sala.
E na cozinha. Em geral adormeço no quarto.

Tudo em minha casa tem existência.
Todas as coisas significo.
Com os olhos. Ou com as mãos.
Minha casa tem silêncios
Que ás vezes ouço. Em meu corpo
Tem silêncios maiores ainda.
Que às vezes ouço. E faço poemas.
Faço poemas dos silêncios que ouço.

Então? gostaram? Viviane, além de poeta, é filósofa. Tem ou não a fala sensível e inteligente, de todo ser humano instigante e provocador? Felizmente, não precisa de nenhum traço arrogante para se dizer gente !

Abraços de Domigo para quem passar por aqui!

Maysa


2 comentários:

Érico Cordeiro disse...

Prima,
Gostei muito dos poemas postados.
Dá vontade de mergulhar no universo dessa grande poetisa (é, na minha época se chamava poetisa - uma sonoridade tão bonita tem essa palavra).
Um fraterno abraço!!!

Maysa disse...

Caro Primo Érico

O que procurava minha sensibilidade encontrou, então repito o final de DESATO:

"Tudo em minha casa tem existência.
Todas as coisas significo.
Com os olhos. Ou com as mãos.
Minha casa tem silêncios
Que ás vezes ouço. Em meu corpo
Tem silêncios maiores ainda.
Que às vezes ouço. E faço poemas.
Faço poemas dos silêncios que ouço".

Fico feliz por ter escolhido, particularmente,a VIVIANE MOSÉ, sua poesia é delicada e forte mas não é afetada, graças a Deus, como a de algumas poetas com visibilidade por aqui!!
Um abraço caloroso
Maysa